A suinocultura brasileira tornou-se nas últimas décadas uma atividade altamente dinâmica, em virtude de mudanças nos hábitos dos consumidores, que estão cada vez mais exigentes em relação à segurança do alimento. Todavia, novas vertentes têm surgido com nichos de mercado onde o consumidor tem buscado produtos com características específicas e diferenciadas com qualidade “premium” como, por exemplo, o suíno gourmet. O chamado suíno gourmet é o animal obtido a partir do cruzamento de raças específicas com o objetivo de entregar ao mercado um produto com maior teor de marmoreio e coloração mais intensa na carne.
A excelência da carne suína está atrelada a alguns fatores que lhe conferem características exclusivas, se diferenciando de todos os outros tipos de carne. Na criação, fatores genéticos, alimentar e manejo em geral, são essenciais para a obtenção de um produto único.
A distribuição da gordura no corpo do suíno pode ser de quatro maneiras, sendo elas: gordura interna, gordura subcutânea, gordura intermuscular e gordura intramuscular. A gordura interna é responsável por revestir as vísceras. A subcutânea está aderida logo abaixo da pele e compreende ao maior depósito de gordura dos animais. A gordura intermuscular é aquela encontrada internamente nos músculos e a gordura intramuscular é formada por feixes de células adiposas, localizada no perimísio, e também pode ser chamada de marmoreio. O lombo é o local de avaliação da quantidade de marmoreio, sendo classificado em traços, leve, pequeno, moderado e abundante.
O suíno gourmet apresenta marmoreio moderado a abundante, o que proporciona maior suculência e maciez à carne. Esta característica de composição da carne faz com que, no momento da mastigação, haja maior liberação de líquido, permitindo uma degustação mais apurada. Nesses primeiros instantes de mastigação, as glândulas salivares são acionadas e há um aumento da salivação. O marmoreio auxilia no padrão de maciez da carne porque no momento da mastigação, a força necessária para cisalhamento será menor, devido à mantença de água no interior do músculo (mesmo depois do cozimento). A maciez da carne se difere entre as espécies, pois está relacionada ao ambiente externo e às condições de armazenamento de gordura na carcaça. Essa gordura armazenada evita a desidratação natural da carne.
A suculência é comprovada também quando, mesmo depois de cozida, a carne retém água no interior do músculo. As reações da gordura da carne são responsáveis por 90% do aroma exalado durante o cozimento. Por isso, a composição lipídica da carcaça, faz total diferença no aspecto sensorial no suíno gourmet.
O suíno gourmet é um projeto de extensão da Universidade Federal de Lavras (UFLA) criado para permitir que pequenos criadores de suínos possam oferecer ao mercado um produto diferenciado com maior valor agregado, permitindo que, mesmo em pequena escala, estes produtores sobrevivam da criação (figura 1).
Um ensaio para avaliação de desempenho dos suínos gourmet foi conduzido pela equipe da UFLA em 2023, com aprovação da comissão de ética no uso de animais (CEUA), protocolo número 034/23 (CEUA/UFLA). Considerando o período total do estudo, fases de creche, crescimento e terminação, foi observado que os animais apresentaram resultados de desempenho (Tabela 1) semelhantes àqueles propostos nas tabelas brasileiras que propõem um consumo de ração médio diário (CRMD) de 2.358g e o ganho de peso médio diário (GPMD) de 927g (média dos valores para suínos de 30 a 100kg de peso na tabela de Rostagno et al. 2017). Considerando que os valores propostos de desempenho nas tabelas foram obtidos com suínos consumindo ração padrão à base de milho e farelo de soja, os suínos gourmet apresentaram CRMD 1,3% acima do esperado com GPMD de 98% em relação aos híbridos comerciais de alto potencial genético com desempenho regular-médio.
Tabela 1: Resultados de peso inicial (PI), peso final (PF), consumo de ração médio diário (CRMD), ganho de peso médio diário (GPMD), conversão alimentar (CA) de suínos gourmet submetidos à alimentação à base de milho e farelo de soja (Milho + soja).
Tratamento I / Milho +soja |
CV (%) | Valor P (%) | |
---|---|---|---|
PF (kg) | 101,5 | 6,97 | 0,0272 |
CRMD (kg) | 2,390 | 2,02 | 0,000 |
GPMD (kg) | 0,911 | 7,07 | 0,002 |
CA | 2,65 | 7,96 | 0,1711 |
Além do desempenho, foram realizadas avaliações de qualidade de carne em laboratório. As análises foram feitas no músculo Longíssimus dorsi (lombo) de suínos gourmet em comparação com amostras de lombos de suínos híbridos comerciais (Tabela 2 e Figura 2).
Tabela 2: Avaliação qualitativa do músculo Longissimus dorsi de suínos gourmet e suínos híbridos comerciais.
Componente (%) |
Gourmet Milho + soja |
Híbrido comercial | CV (%) | Valor P (%) |
---|---|---|---|---|
Colágeno | 0,83a | 0,68a | 17,26 | 0,0573 |
Proteína | 23,93a | 24,86a | 3,32 | 0,0665 |
Gordura | 5,24a | 2,50b | 34,82 | 0,0041 |
Umidade | 68,28a | 70,11a | 2,11 | 0,0451 |
Minerais | 2,41a | 2,63a | 10,78 | 0,3309 |
Perdas de líquido | 15,430a | 25,217a | - | - |
Considerando os resultados obtidos no período total de criação, compreendendo as fases de creche, crescimento e terminação, conclui-se que os suínos gourmet, apresentaram desempenho acima do esperado em função de sua composição genética e as análises de laboratório confirmam a superioridade da qualidade de carne dos suínos gourmet.