Cada vez mais se dá atenção ao chamado período de transição (PT) que inclui os últimos dez dias de gestação e os primeiros 10 dias de lactação. As necessidades de nutrientes durante o PT mudam rapidamente, tanto de energia quanto de proteína e aminoácidos.
Em geral, podemos dizer que as dietas de gestação possuem baixa densidade proteica e energética, enquanto as dietas de lactação contêm alto conteúdo proteico e energético, além de níveis e qualidade muito diferentes de de fibra e cálcio / fósforo digestível, o que implica em um salto quantitativo e qualitativo que devemos levar em consideração. Na prática, muitas vezes limitada por fatores de infraestrutura e manejo, a transição de um alimento para o outro é feita da maneira que for melhor para cada um, compreendida como a mais fácil, e não necessariamente a melhor do ponto de vista nutricional.
Diante de qualquer problema em fêmeas em lactação, devemos nos referir a tudo o que fizemos na granja durante os seis meses anteriores. Não pode haver uma fase de lactação adequada se não tivermos feito um correto manejo e nutrição das porcas durante a lactação anterior, e desde o momento do desmame do ciclo anterior até a sua entrada na maternidade.
Neste ponto, a manutenção da homeostase e condição corporal das fêmeas será fundamental para compreender muitos dos distúrbios que podem surgir no caso de desvios desses dois pontos da base do metabolismo, e que expressamos no gráfico a seguir:
Elementos a serem considerados ao aumentar as necessidades nutricionais no PT:
- Crescimento fetal
- Desenvolvimento mamário
- Necessidades de manutenção
- Necessidade de ganho de peso das fêmeas
- Mobilização de reservas corporais
- Produção de colostro
- Produção de leite
- Número de fêmeas em parto: primeira e segunda parição versus multíparas
- Peso das reprodutoras em um determinado momento produtivo com base na genética
- Produtividade de cada fêmea
Pontos críticos afetados na prática pela nutrição no período de transição
1) Crescimento fetal e peso da leitegada ao nascer: quase metade do peso ao nascer ocorre nas últimas 3-4 semanas de gestação. O crescimento fetal durante a primeira metade do PT é estimado em 25-30% do peso ao nascer. Isso significa um aumento nas necessidades de proteínas e aminoácidos da fêmea. Se a ingestão de nutrientes nesses dias não for suficiente para a manutenção corporal, as reservas de gordura e proteína serão mobilizadas para o crescimento fetal e tecidos reprodutivos. Isso não significa que influenciará linearmente o peso dos leitões ao nascer, mas significa negativamente na fisiologia reprodutiva da porca. Como não sabemos o número exato de fetos, é difícil estabelecer as necessidades nutricionais exatas.
2) Crescimento da placenta, útero e fluidos amnióticos: os fluidos amnióticos e as membranas aumentam desde o início da gestação até os 80-85 dias, de modo que suas variações no PT não têm grande influência nas necessidades nutricionais. Pelo contrário, o crescimento exponencial da placenta e das trompas uterinas influenciam o conteúdo de aminoácidos. Ao final do parto, os nutrientes retidos na placenta e nos fluidos e membranas expelidos são perdidos pela fêmea, resultando em um saldo negativo. Por outro lado, quando ocorre a regressão das duas trompas uterinas, os nutrientes que elas fornecem passam para o sangue e vão para a produção de leite. Não se sabe exatamente como a nutrição das reprodutoras afeta a regressão do tecido uterino neste período de transição.
3) Desenvolvimento do tecido mamário: a lactogênese inicia-se aos 90 dias de gestação, admitindo-se que o crescimento das mamas ocorra no último terço da gestação, sendo seu desenvolvimento maior nos últimos dez dias anteriores ao parto (apesar da visualização) e dividindo-se em duas fases:
- Fase I: preparação do tecido mamário para a síntese dos constituintes do leite
- Fase II: secreção de colostro. O maior crescimento do tecido mamário ocorre nos dez dias anteriores ao parto, continuando nos dez dias seguintes, mas já em ritmo menor. A nutrição neste período desempenha um papel fundamental no desenvolvimento das mamas.
4) Produção de calor endógeno: a produção de leite leva a um aumento na produção de calor. As necessidades de energia de manutenção são maiores durante o parto do que na gestação, sendo constantes com base no peso metabólico (460 vs 405 kJ / kg - NRC 2012), o que nos indica que as necessidades de energia de manutenção nos dez dias anteriores ao parto permanecem constantes, dependendo do peso da fêmea. No primeiro dia após o parto, devido à quantidade-composição do colostro, a perda adicional de calor endógeno é baixa, mas a partir do segundo dia pós-parto a perda de calor aumenta consideravelmente em relação à quantidade de leite produzida. Entre o dia 2 e o dia 10 de lactação, o aumento na produção de calor é equivalente ao conteúdo de energia de meio quilo de ração.
5) Processos fisiológicos de adaptação: a fase de gestação é considerada um período de anabolismo, enquanto durante a lactação estamos em um período de catabolismo. Como regra geral, a energia consumida por uma porca na gestação, 70% é para cobrir suas necessidades de manutenção e apenas 30% é utilizada na produção (fetos, placenta, líquido amniótico, membranas, útero), enquanto na lactação 70% vai para a produção de leite, muito mais exigente metabolicamente do que para o desenvolvimento de fetos. Isso implica em uma mudança no metabolismo do fígado com um aumento de três vezes no fluxo plasmático arterial e um aumento no consumo de oxigênio estimado em + 40% durante a lactação. Uma função essencial do fígado neste período é manter a homeostase da glicose, sendo mais eficiente utilizá-la das reservas do que da própria ração. Isso deve nos fazer refletir sobre a importância das reservas de glicogênio nesse período de transição, acumulando-se o máximo possível nos últimos dez dias de gestação e evitando um grande esgotamento dessas reservas nos primeiros dez dias de lactação por meio de uma ingestão elevada contínua. Quando tem intervalo de mais de quatro horas entre as mamadas em fêmeas hiperprolíficas, os níveis de glicose no plasma caem dramaticamente. Estudos têm sido realizados sobre a relação entre os níveis de uréia plasmática em fêmeas na época do parto e a produção de colostro com uma correlação positiva (Loisel, 2014) que mostra que o metabolismo hepático afeta a produtividade das reprodutoras durante o período de transição, sabendo que a uréia é produzida no fígado (oxidação de proteínas).