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Mortalidade de matrizes suínas: devemos nos preocupar com este tema? (1/2)

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Quando se busca o alto desempenho, o entendimento global do papel das matrizes como protagonistas do sistema deve estar no radar de gestores e técnicos.

Na produção de suínos, é comum que seja dado um foco de trabalho bastante voltado ao leitão, já que é o produto final de venda. Porém, quando se busca o alto desempenho, o entendimento global do papel das matrizes como protagonistas do sistema deve estar no radar de gestores e técnicos que buscam eficiência produtiva, sanitária, econômica e bem-estar animal (quadro 1).

Quadro 1: Reflexões sobre a importância das matrizes no desempenho do sistemas de produção

Custo de produção

A reposição é o segundo maior centro de custo das granjas, precedida apenas pela nutrição e a longevidade da matriz é um importante indicador financeiro, já que a taxa interna de retorno (sobre o investimento) está entre o 3º e 4º partos na maioria dos sistemas.

Desempenho reprodutivo

O desempenho do rebanho de reprodução é base da produção, definindo o fluxo de leitões pela taxa de parição e número de nascidos.

Peso ao desmame

Na maternidade, as fêmeas produzem o leite, substrato para o crescimento dos leitões que são a fonte de remuneração do sistema de produção em kg produzidos/fêmea/ano.

Sanidade

As matrizes são, em boa parte, responsáveis pela sanidade do sistema, já que colonizam sua progênie, ainda durante a lactação, com os principais agentes de importância sanitária nas fases pós-desmame.

Com este entendimento, além dos indicadores reprodutivos, passa-se também a avaliar a mortalidade de plantel, por seu impacto sobre a taxa de reposição e sobre o custo. Sob a ótica financeira, o retorno sobre o investimento das matrizes acontece depois do terceiro parto (Lucia Jr et al., 2000) e, como mais da metade da mortalidade de matrizes acontece antes deste momento, tem um impacto alto e direto nos custos de produção (Schwertz et al., 2021).

Então, a resposta para a pergunta do título deste artigo é SIM, devemos nos preocupar com este tema em nossos sistemas de produção utilizando profundidade de análise para buscar soluções e prevenção.

Como referências de análise deste parâmetro, Morés e Morés (2007) indicam como alvo uma taxa de mortalidade de matrizes entre 5 e 8% e sugerem que medidas de interferência devem ser tomadas quando ultrapassar 10%.

Dados americanos publicados recentemente podem auxiliar o entendimento do momento atual. Em um compilado com 647 granjas americanas equivalente a mais de 1.680.000 matrizes, 62% das granjas estão com a mortalidade já em nível crítico acima de 10% e fica evidente o aumento significativo ano a ano (figuras 1 e 2).

Figura 1: Histórico de mortalidade de matrizes suínas em rebanhos americanos de 2017 a 2021. Adaptado de Porkcheckoff (2021).
Figura 1: Histórico de mortalidade de matrizes suínas em rebanhos americanos de 2017 a 2021. Adaptado de Porkcheckoff (2021).
Figura 2: Mortalidade e eutanásia de matrizes suínas em 647 granjas americanas. Adaptado de Porkcheckoff (2021).
Figura 2: Mortalidade e eutanásia de matrizes suínas em 647 granjas americanas. Adaptado de Porkcheckoff (2021).

Sobre dados brasileiros, Queirós (2022) apresentou um compilado de dados de 133 granjas com aproximadamente 240.000 matrizes com uma mortalidade média de 9,0% (tabela 1) e um comportamento de elevação de acordo com o aumento do tamanho da granja.

Nº de matrizes alojadas Até 1000 1001 - 2000 2001 - 4000 4001 - 7000 > 7001 Média
Total de matrizes / categoria 67.200 31.740 35.580 62.620 42.500 239.640
Total de granjas / categoria* 82 19 15 12 5 133
Mortalidade de matrizes 8,4% 9,4% 9,6% 11,2% 11,3% 9,0%

Tabela 1. Compilado de dados de mortalidade de matrizes suínas em granjas brasileiras no ano de 2021, de acordo com o tamanho do rebanho. Queirós (2022): apresentação oral *granjas do RS, SC, PR, MS, MT, SP, MG e ES.

Com foco na busca de soluções, certamente o primeiro ponto é o entendimento de quais são as causas mais frequentes de morte de matrizes e é muito comum nos deparamos com causas específicas pobremente entendidas, pois o exame “post mortem” detalhado e exames complementares são raramente executados (Mores et al., 2007) e é muito frequente encontrar causas inespecíficas registradas (outras causas, sacrificada, fraca, caquética, desconhecida, morte súbita, etc.).

Mineração dos dados para identificação de causa raiz

Embora estejamos falando de um dado individualizado às condições de cada granja, alguns fatores predisponentes se repetem nos trabalhos que estudaram a mortalidade de matrizes, entre eles: a produtividade da granja, sistema de alojamento das matrizes durante a gestação, a fase da vida produtiva, a qualidade da água, a escala de produção, momentos de ampliação de plantel e o ciclo da matriz. Vamos discutir um pouco sobre cada um deles.

Existe uma tendência de que o nível de produtividade da granja possa ser também um indicador de maior sobrevivência de matrizes, subentendendo-se que, em granjas com maior número de leitões entregues/fêmea/ano (LEFA), todo o cuidado de manejo geral com os suínos tenha uma qualidade melhor, tanto para leitões como para matrizes (figura 3).

Figura 3: Mortalidade de matrizes de acordo com a produtividade da granja. Banco de dados Atualtech. Queirós, 2022: apresentação oral Sinsui.
Figura 3: Mortalidade de matrizes de acordo com a produtividade da granja. Banco de dados Atualtech. Queirós, 2022: apresentação oral Sinsui.

O sistema de alojamento das matrizes gestantes também tem sido um desafio com a migração para as baias coletivas. Ainda não há consenso sobre o número ideal de fêmeas por baia, o tipo de instalação (piso) e forma de alimentação destas matrizes. É preciso destacar que a mudança do sistema de gestação individual para o sistema coletivo não significa, por si só, uma melhora nas condições de bem-estar dos animais. Nesse modelo o estresse relacionado ao reagrupamento e alimentação, constitui um dos principais desafios do sistema, brigas e disputas seguidas de lesões e traumas são rotineiramente observadas no momento da organização hierárquica da baia (Perrozan e Calegari, 2020). Portanto, granjas com baias coletivas tem desafios maiores em relação a mortalidade.

Quando o ciclo de produção é discutido, o periparto (últimos dias de gestação e primeiros dias de lactação) se apresenta como o mais crítico. Embora represente apenas aproximadamente sete dias em cada ciclo, responde por quase 40% das mortes (Matias, 2020; Morés et al., 2007) e, quando considerado o periparto + a lactação inteira, facilmente temos 60-65% das mortes ocorrendo nas instalações de maternidade, sendo falha cardíaca e prolapso as causas mais frequentes neste período. O final de gestação, a transferência para a maternidade, o decorrer do parto, intervenções obstétricas e o desafio da recuperação uterina e início da produção de leite fragilizam a matriz, necessitando de muita atenção e o melhor manejo possível.

Sobre a qualidade da água, é indiscutivelmente um ponto de impacto sobre a mortalidade de matrizes, já que a infecção urinária figura com frequência entre as principais causas associada a morte súbita de matrizes. Embora pareça menos relevante atualmente em alguns sistemas de produção, não podemos baixar a guarda e precisamos manter a consciência a respeito de disponibilizar em quantidade e qualidade em nossas granjas. No trabalho de Chipman et al. (2009), nas granjas com água não tratada a mortalidade média do período foi de 13,2% contra 10,5% nas granjas com água tratada (figura 4), associando assim a qualidade da água como ponto de risco para sobrevivência.

Figura 4: Índice de mortalidade de matrizes em granjas com água tratada ou não tratada. Chipman et al. (2019).
Figura 4: Índice de mortalidade de matrizes em granjas com água tratada ou não tratada. Chipman et al. (2019).

Em situações práticas, é estimado um consumo de água de bebida de aproximadamente 5.800 L de água/ano, o que torna evidente a necessidade de garantir qualidade e disponibilidade. Com frequência, em granjas com mortalidade elevada, são identificados fatores de riscos ligados a sistemas com falhas de acesso a água, escore corporal acima do desejável e problemas locomotores, todos culminando em sinais clínicos de infecção urinária (Morés et al., 2007).

Ainda avaliando os fatores que inferem na mortalidade de porcas, Queirós (2022) identificou que o processo de ampliação das granjas, independentemente da escala de produção, pode promover um aumento da mortalidade (figura 5). Em geral, o desafio de conduzir o processo de aclimatação e preparação de um grande grupo de leitoas associada a distração que a obra pode gerar na equipe são os pontos que podem culminar nesta situação.

Figura 5: Mortalidade de matrizes em granjas estabilizadas ou que passaram por ampliação. Banco de dados de 240.000 matrizes de133 granjas brasileiras. Queirós, 2022: apresentação oral Sinsui.
Figura 5: Mortalidade de matrizes em granjas estabilizadas ou que passaram por ampliação. Banco de dados de 240.000 matrizes de133 granjas brasileiras. Queirós, 2022: apresentação oral Sinsui.

Esse achado levou os autores a um próximo passo, que foi a estratificação por ciclo, buscando o entendimento se há um perfil de matrizes mais propensas a mortalidade. Como forma de ilustrar a informação que foi gerada, a figura 6 apresenta a compilação dos dados e uma comparação da mortalidade real e esperada, caso a meta fosse atingida. Com esta estratificação, ficou claro que as fêmeas jovens (leitoas pré-púberes e ciclo 1) devem ser o principal foco de ação, já que extrapolam a meta de mortalidade em 300% e 129%, respectivamente.

Figura 6: Estratificação da mortalidade por ciclo das matrizes (OP = ordem de parição). Banco de dados de 240.000 matrizes de 133 granjas brasileiras. Queirós, 2022: apresentação oral Sinsui.
Figura 6: Estratificação da mortalidade por ciclo das matrizes (OP = ordem de parição). Banco de dados de 240.000 matrizes de 133 granjas brasileiras. Queirós, 2022: apresentação oral Sinsui.

Mesmo que tenhamos gerado toda a informação acima, ela servirá apenas como um guia com sugestões, já que há um risco implícito conhecido sempre que parâmetros são avaliados exclusivamente pela sua média ou as decisões são tomadas baseadas em extrapolação de resultados de outros bancos de dados como se fossem verdades absolutas para a nossa granja.

Não é diferente no caso da mortalidade de matrizes, onde a mineração de dados gerados de forma confiável permite maior assertividade na escolha das ações. A partir daí, o próximo passo é desenvolver planos de ação aplicáveis aos pontos que foram eleitos como primários para aumentar a sobrevivência e reduzir as perdas.

Comentários ao artigo

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04-Jul-2022 andreasilvestriExcelente material! Precisamos estar atentos a este "alto" percentual de mortalidade das fêmeas de alta performance. Observamos a campo que este numero é crescente e é preciso intervenções, especialmente referente ao consumo de agua diário! Parabéns à Dra Djane e ao Anderson!
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