Como já foi mencionado no artigo "Estratégias de alimentação em fêmeas durante a última semana de gestação", o consumo elevado e até ad libitum nesta fase, permite que as necessidades fisiólogicas da fêmea sejam supridas não só na última fase da gestação, mas também durante o parto e os primeiros dias de lactação.
Segundo o modelo para as necessidades diárias de lisina e energia realizado por Theil et al. (2017) com um alimento de 2900 kcal e 0,5% de Lis, os consumos ótimos seriam:
- Parto: 4,5 kg de alimento com 7,7 g de Lis SID.
- Terceiro dia de lactação: 6,1 kg de alimento com 6,4 g de Lis SID.
Por isso fica evidente que, durante os primeiros dias de lactação o objetivo deve ser aumentar rápido o consumo de ração, portanto não podemos racionar a alimentação da fêmea antes do parto; já que, se depois deste racionamento lhes proporcionamos alimento ad libitum, as fêmeas comem em excesso, o que pode fazer com que rejeitem o alimento ou que diminuam notavelmente o consumo posterior, entre os dias 5 e 10 da lactação (KSU Applied Swine Nutrition Team, 2007).
A importância de um consumo elevado durante os primeiros cinco dias de lactação e a sua relação positiva com o consumo médio diário durante toda a lactação foi demonstrada num estudo realizado na nossa granja experimental em 2015. (Ilustração 1).
No mesmo trabalho comparou-se também o consumo de fêmeas alimentadas ad libitum e com alimentação restrita, obtendo-se conclusões muito interessantes.
Observou-se que as fêmeas alimentadas ad libitum, em comparação com as alimentadas com uma curva convencional, tiveram um consumo médio diário mais elevado durante a primeira semana de lactação e perderam menos peso. Além disso, o aumento da leitegada foi superior, e o desmame de leitões teve um maior peso (Tabela 1).
Tabela 1 Diferenças observadas durante a lactação, com uma alimentação ad libitum em comparação com uma alimentação padrão convencional (com restrições). (Nutreco R & D, 2015)
Programa de alimentação | Ad libitum | Convencional |
Nº de fêmeas | 23 | 25 |
Consumo médio / dia (0 – 7 dias), kg/dia | 5,5 a | 4,9 b |
Consumo médio / dia (0-21 dias), kg/dia | 6,8 | 6,6 |
Perda de peso da porca, kg | 17,6 | 19,8 |
Peso dos leitões ao desmame, kg | 7,62a | 7,1b |
Aumento da leitegada, kg | 97 a | 90,2b |
Observou-se também que por cada quilograma que se aumentava no consumo da fêmea em lactação, o peso da leitegada ao desmame aumentava em 6,8 kg e a fêmea perdia 5 kg menos de peso (Ilustração 2).
Neste mesmo estudo pôde comprovar-se como o padrão de alimentação de ambos os grupos foi diferente. O grupo alimentado ad libitum foi capaz de ter um maior consumo devido ao aumento de número de vezes que se alimentam por dia, no entanto com menor quantidade de alimento. Já, o grupo com alimentação racionada comem menos vezes ao dia, mas maior quantidade de cada vez. (Ilustração 3)
Uma meta análise de 10 provas de curvas de consumo de alimentação realizadas nas nossas granjas experimentais no Canadá (NS Ferguson, 2010) com um total de 760 fêmeas com lactações médias de 20 dias conclui que por cada kg adicional de consumo médio diário durante a lactação, a perda de peso da fêmea era reduzida em mais de 13 kg e quase 2mm de espessura de gordura dorsal no ponto P2 e aumentava o peso dos leitões ao desmame em mais de 0,5 kg (Ilustração 4), embora aumentasse o custo da alimentação e o desperdício de alimento.
Um aumento do consumo da fêmea em lactação de 1 kg/dia:
- Aumentou o ganho médio da leitegada em 406 g/dia em primíparas e 199 g/dias em multíparas, em média 352 g/dia.
- Aumentou o peso dos leitões ao desmame 0,517 kg e da leitegada em 5,705 kg.
- Reduziu a perda de peso em 6,56 kg em primíparas e 13,72 kg em multíparas.
- Reduziu a perda de espessura da gordura dorsal em 1,84 mm em multíparas, não havendo uma diferença significativa em nulíparas.
Recentemente, Strathe et al. (2015) chegaram a conclusões semelhantes num estudo realizado com 565 porcas com leitegadas estandardizadas com 14 leitões no segundo dia pós-parto: 13,0 ± 1,1 leitões desmamados, CMD de 6,1 ± 0,7 kg/dia, GMD da leitegada 2,92 ± 0,53 kg/dia (desmame aos 26 dias), perda de peso da porca 22,5 ± 12,7 kg PV e 2,9±1,7mm P2, IDC 5,3 ±6,1 dias, nascimentos totais do seguinte ciclo 18,2±3.8 (A. V. Strathe, 2015).
Assim, aumentar o CMD em 1 kg/dia aumentou:
- GPD da leitegada em 220 g/dia em primíparas e 440 g/dia em multíparas, em média 340 gramas.
- GPD= 0,85 + 0,34 * CMD (kg/dia); r=0,46; p< 0,001.
- Reduziu a perda de peso em 6,6 kg em primíparas e 13,9 kg em multíparas.
- Reduziu o IDC e aumentou o número de nascimentos totais no parto seguinte.
Concluiu-se assim que as porcas hiperprolíficas conseguem uma alta produção de leite através de um elevado consumo de alimento e da mobilização das reservas corporais.
Num outro artigo publicado recentemente na 333, Bruno Silva desenhou um estudo para avaliar o impacto da restrição alimentar durante a lactação. Estudou-se o impacto da restrição alimentar sobre o rendimento e também com o objetivo de determinar se a mobilização dos tecidos corporais durante a lactação poderia afetar o tamanho da leitegada e o rendimento da fêmea na lactação seguinte.
Observou-se que as fêmeas alimentadas ad libitum perderam 20 quilos menos, houve menor perda de P2 e os leitões pesaram 0,5 kilos mais (Tabela 2).
Tabela 2. Impacto da restrição alimentar sobre o rendimento das leitegadas durante os 28 dias de lactação. Adaptado de De Bettio et al., 2016 publicado por Bruno Silva ( 2017) em 333
Parâmetros | Tratamentos | DER1 | Estatísticas | ||
Ad libitum | Restrição | ||||
Número de porcas | 20 | 20 | |||
Consumo (d 1- desmame), kg d-1 | 6,43 | 4,14 | 0,24 | TL*** | |
Perda de peso corporal da porca, kg | 7,8 | 28,2 | 8,5 | TL*** | |
Intervalo desmame-cio, d | 4,3 | 4,3 | 0,5 | ||
Tamanho da leitegada | |||||
Ao parto | 15,1 | 15,1 | 2,6 | ||
Ao desmame | 12,9 | 12,8 | 0,9 | ||
Peso médio leitão, kg | |||||
Ao parto | 1,36 | 1,39 | 0,21 | ||
Ao desmame | 7,40 | 6,93 | 0,63 | TL† | |
Peso da leitegada, kg | |||||
Ao parto | 20,50 | 21,00 | 3,29 | ||
Ao desmame | 95,31 | 88,56 | 4,54 | TL* | |
Ganho de peso da leitegada, kg d-1 | 2,70 | 2,43 | 0,36 | TL*TL* | |
Produção láctea, kg d-1 | 8,33 | 6,99 | 1,16 | TL** | |
Eficiência da lactação, % | 72,93 | 82,30 | 8,77 | TL* | |
Tamanho da leitegada no parto seguinte | 15,10 | 14,07 | 1,52 | TL† |
1Desvio padrão Residual
2 Obtido por análise de variância (modelo linear geral que inclui os efeitos do número de parto (O), tratamento (TL) e reprodução da porca (G) e as suas interações (TLxO; TLxG).
Conclusões
Todas as provas analisadas sustentam a forte correlação positiva entre o consumo da fêmea em lactação e o peso dos leitões ao desmame. Este consumo traz sempre consigo uma menor perda de P2 e peso por parte da fêmea. Assim, devemos maximizar esse consumo por parte da fêmea o mais cedo possível.