Neste artigo apresentamos, em modo de glossário, um leque de estratégias que são desde ingredientes, aditivos, até outras estratégias nutricionais que podem ser de interesse para o manejo da saúde intestinal. Para facilitar a compreensão do mecanismo de ação e dos efeitos esperados de cada estratégia, os dividimos em quatro grandes mecanismos de ação que apresentaremos detalhadamente nos próximos artigos: potenciar a resposta imunitária, reduzir a carga de bactérias patogênicas, estimular a colonização de uma microbiota benéfica e estimular a digestão (Tabela 1). É importante mencionar que algumas destas estratégias devem os seus resultados a efeitos multifatoriais e por isso, podem ser incluídas em diferentes mecanismos.
Tabela1. Classificação dos principais mecanismos de ação que têm as diferentes estratégias para melhorar a saúde intestinal.
Potenciação da resposta imunitária e da função barreira | Redução das bactérias patogênicas | Estimulação da microbiota benéfica | Estimulação da digestão e da utilização de nutrientes |
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Ácidos graxos polinsaturados | Fibra fermentável | Fibra fermentável | Fibra fermentável |
Probióticos | Redução do nível proteínas | Redução do nível proteínas | Redução do nível proteínas |
Prebióticos | Dietas fermentadas | Dietas fermentadas | Dietas fermentadas |
Simbióticos | Dietas com baixa capacidade tampão | Probióticos | Dietas com baixa capacidade tampão |
Nucleotídeos | Probióticos | Prebióticos | Diminuição fatores anti-nutricionais |
Proteínas e peptídeos bioativos | Prebióticos | Simbióticos | Probióticos |
Aminoácidos | Simbióticos | Ácidos inorgânicos e orgânicos | Simbióticos |
Fitogênicos | Ácidos inorgânicos e orgânicos | Enzimas | Ácidos inorgânicos e orgânicos |
Oligoelementos | Proteínas e peptídeos bioativos | Enzimas | |
Fitogênicos | Nucleotídeos | ||
Oligoelementos | Proteínas e peptídeos bioativos | ||
Aminoácidos | |||
Oligoelementos |
Probióticos: Microrganismos vivos que quando administrados na forma e quantidades adequadas podem transferir benefícios para o hospedeiro. Atualmente, os mais usados na produção suína pertencem aos gêneros Bacillus, Lactobacillus, Bifidobacterium, Enterococcus e Saccharomyces. Há evidências de que têm a capacidade de potencializar a resposta imunitária, reduzir a carga de bactérias patogênicas, estimular a colonização por uma microbiota benéfica e estimular a digestão.
Prebióticos: Ingredientes não digestíveis que beneficiam o hospedeiro estimulando seletivamente o crescimento ou a atividade de uma bactéria (ou um número limitado de bactérias) no intestino. Dentro dos prebióticos mais utilizados nos suínos incluem-se os mananoligossacáridos (MOS), frutose-oligossacáridos (FOS), inulina ou lignocelulose.
Simbióticos: Mistura específica de probióticos e prebióticos, onde os prebióticos melhoram a sobrevivência, implantação ou função de determinados microrganismos probióticos. É um conceito que ainda não está muito implementado nos suínos, principalmente porque os seus efeitos e sinergias podem ser amplamente afetados por condições externas. Não obstante, ultimamente estão ganhando mais importância graças ao maior entendimento que nos dão as técnicas de análise molecular e prevê-se que tenham maior popularidade no futuro. Algumas combinações utilizadas nos suínos são FOS e Lactobacillus paracasei (Bomba et al., 2002) ou inulina com Enterococcus faecium (Bohmer et al., 2005).
Ácidos orgânicos (e seus sais): Produtos energéticos utilizados na alimentação animal devido à sua elevada digestibilidade, capacidade acidificante, estimulação da função digestiva, poder antimicrobiano e estimulação de uma microbiota benéfica. Os ácidos mais utilizados como conservantes são o fórmico e o propiônico. Os ácidos acético, butírico, cítrico, láctico e fumárico são frequentemente usados em rações de animais jovens para evitar o aparecimento de diarreias pós-desmame, melhorando a digestão e diminuindo a presença de agentes patogênicos.
Enzimas: Enzimas exógenas que são incorporadas na dieta devido ao seu potencial para melhorar a utilização de nutrientes da dieta, bem como para influenciar o perfil da microbiota do intestino. As mais utilizadas na atualidade são as fitases, as xilanases, as β-glucanases ou as proteases.
Nucleotídeos: São a unidade estrutural dos ácidos nucleicos das células, bases púricas e pirimidínicas, componentes do ácido desoxirribonucleico (ADN) e do ácido ribonucleico (ARN). Em condições normais são sintetizados pelo animal com base em precursores (aminoácidos), ou por meio da degradação de aminoácidos e nucleótidos da dieta. Contudo, considera-se que quando há um crescimento rápido, uma doença, um consumo limitado de nutrientes ou transtornos endógenos, o fornecimento exógeno de nucleótidos pode trazer benefícios. É-lhes atribuída capacidade de imunomodulação e de melhoria da utilização de nutrientes.
Proteínas e peptídeos bioativos: São proteínas ou componentes das proteínas com capacidade de exercer uma notória atividade antimicrobiana ou outras atividades biológicas específicas. Destacam-se pelo seu potencial na saúde intestinal:
- Glicomacropeptídeo: Peptídeo obtido a partir da digestão do lactosoro com Kcaseína. São atribuídas a ele funções imunomoduladoras, de proteção da barreira intestinal e antimicrobianas.
- Lactoferrina: Glicoproteína presente no leite com uma elevada capacidade de se unir ao ferro. Pode exercer atividades antimicrobianas e imunomoduladoras.
- Ovotransferrina: Glicoproteína presente na clara do ovo com efeitos análogos à lactoferrina dos mamíferos. Pode ter atividades antimicrobianas e imunomoduladoras.
- Factores de crescimento: Peptídeos presentes nos fluidos corporais (principalmente no leite) com capacidade para estimular a mitose celular e com demonstradas capacidades de regeneração da morfologia intestinal e imunomodulação.
- Imunoglobulinas: Proteínas provenientes do leite, plasma animal ou ovos de galinha. São substâncias bioativas que outorgam imunidade passiva ao animal e são capazes de prevenir a aderência de bactérias patogênicas às células epiteliais, de aglutinar bactérias, de neutralizar toxinas e de inativar vírus.
- Lisozima: Proteína extraída principalmente do ovo ou do leite, com atividade antimicrobiana contra bactérias Gram positivas (por provocar uma lise da parede celular) e tem propriedades imunomoduladoras.
Aminoácidos: O uso de aminoácidos cristalinos permite reduzir os níveis de proteína bruta da dieta (uma estratégia nutricional para melhorar a saúde intestinal) cobrindo com maior precisão o perfil de proteína “ideal”. Por outro lado, os aminoácidos treonina, glutamina, arginina e serina têm um papel destacado na saúde intestinal devido à sua capacidade de incidir no metabolismo e na arquitetura intestinal.
Fitogênicos: Incluem as plantas aromáticas (ervas e espécies), extratos de plantas e ácidos voláteis (normalmente conhecidos como “óleos essenciais”). Os princípios ativos principais são os ácidos voláteis (timol, cinamaldeído, β-ioninea e carvacol) e compostos polifenólicos. É atribuída a eles a capacidade de modular a resposta imunitária e a microbiota intestinal (com efeitos antimicrobianos contra bactérias patogênicas).
Oligoelementos ou elementos raros: São necessários em quantidades mínimas para apoiar o crescimento, desenvolvimento e função ótima de um organismo. O mais importante em relação à saúde intestinal é o zinco e, em menor medida, o cobre, oligoelementos necessários para muitos processos metabólicos. Uma elevada inclusão de óxido de zinco (ZnO) (de 2000 a 3500mg/kg) pode melhorar a saúde intestinal pela redução de agentes patogênicos, melhorias na digestão, na função barreira e no sistema imunitário do animal. Não obstante, devido aos problemas ambientais que o ZnO convencional implica, está caindo em desuso e atualmente utilizam-se novas formas melhoradas com mais eficácia terapêutica em doses menores como o ZnO microencapsulado.
Fibra fermentável: O aumento da fibra fermentável fornece um substrato para a fermentação de bactérias do cólon, com benefícios que incluem uma população bacteriana mais complexa, mais produção de ácidos graxos de cadeia curta in-situ e modificações no trato digestivo e integridade da mucosa.
Gorduras poliinsaturadas: A sua suplementação, em particular com o ácido graxo essencial omega-3 (por exemplo com óleos de peixe ou linhaça), pode trazer benefícios a nível imunitário ao serem componentes estruturais das membranas celulares, das moléculas de sinalização e precursores da síntese de eicosanoides (promotores de inflamação).
Fontes de proteína de alto valor biológico e elevada digestibilidade: são fontes de proteína altamente digeríveis e palatáveis, muito utilizadas em rações de primeiras idades, não apenas pelo seu elevado valor nutricional como também pelas suas propriedades de influenciar a saúde intestinal.
- Hidrolisado de mucosa intestinal: Destaca-se pela sua palatabilidade muito alta e presença de peptídeos bioativos com efeitos antimicrobianos e imunomoduladores.
- Plasma suíno atomizado: Inclui imunoglobulinas e peptídeos que transferem imunidade passiva ao animal.
- Gema de ovo (imunizada): Provenientes de galinhas que foram imunizadas contra bactérias patogênicas. Além de um conteúdo alto em proteína de qualidade, incluem anticorpos específicos com capacidade para neutralizar agentes patogênicos específicos.
- Colostro bovino: Contém elevados níveis de peptídeos antimicrobianos, imunoglobulinas e fatores de crescimento que ajudam a modular a imunidade bem como conferem imunidade passiva contra agentes patogênicos.
- Lactosoro: Tem um elevado conteúdo em cisteína que lhe confere efeitos imunomoduladores e contribui para a síntese de glutatião, um potente antioxidante intracelular.
Modificações da dieta
Ajustar níveis de proteína: A redução dos níveis de proteína reduz as bactérias capazes de a fermentar, limitando a presença de agentes patogênicos e da inflamação da mucosa intestinal. Não obstante, para poder reduzir os níveis de proteína para níveis de <180g/kg é necessário suplementar a ração com aminoácidos essenciais sintéticos.
Dietas pré-fermentadas: Têm especial interesse as dietas líquidas pré-fermentadas. A fermentação por parte das bactérias ácido-lácticas melhora a disponibilidade de nutrientes e também demonstrou efeitos de modulação imunológica e da microbiota intestinal.
Dietas com baixa capacidade tampão: Dietas com baixa capacidade para bloquear o ácido gástrico, especialmente associadas a ingredientes minerais e concentrados proteicos. São especialmente úteis em animais jovens com uma capacidade de acidificação limitada e podem trazer benefícios na redução de agentes patogênicos e melhorias na capacidade digestiva.
Diminuir a presença de fatores anti-nutricionais: Substâncias presentes em vegetais que reduzem o consumo, diminuem a digestibilidade e/ou aumentam a viscosidade do alimento. Atualmente o mercado dispõe de concentrados vegetais processados, mais nutritivos e com níveis muito mais reduzidos de fatores anti-nutricionais, por exemplo, os concentrados proteicos hidrolisados de soja.